Os Meus 10 Poemas Preferidos

Poesia é a refeição quente no fim do dia gelado. Sair-se de si, fluir por aí. É género literário e faca afiada, música da alma, prece do solitário, do artista e da viúva, que se deixou perder também.  Poesia é o que se perde no barco e se encontra no mar. Palavras que se respiram e inspiram. Não se pensa poesia, sente-se.

 

10 :Nascemos para o sono- Herberto Hélder

Nascemos para o sono,

nascemos para o sonho.

Não foi para viver que viemos sobre a terra.

Breve apenas seremos erva que reverdece:

verdes os corações e as pétalas estendidas.

Porque o corpo é uma flor muito fresca e mortal.

 

 

9:Maria teresa horta- Minha senhora de mim

Comigo me desavim

minha senhora

de mim

 

sem ser dor ou ser cansaço

nem o corpo que disfarço

 

Comigo me desavim

minha senhora

de mim

 

nunca dizendo comigo

o amigo nos meus braços

 

Comigo me desavim

minha senhora

de mim

 

recusando o que é desfeito

no interior do meu peito

 

8:Versos de Orgulho- Florbela Espanca

O mundo quer-me mal porque ninguém

Tem asas como eu tenho! Porque Deus

Me fez nascer Princesa entre plebeus

Numa torre de orgulho e de desdém!

 

Porque o meu Reino fica para Além!

Porque trago no olhar os vastos céus,

E os oiros e os clarões são todos meus!

Porque Eu sou Eu e porque Eu sou Alguém!

 

O mundo! O que é o mundo, ó meu amor?!

O jardim dos meus versos todo em flor,

A seara dos teus beijos, pão bendito,

 

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços...

São os teus braços dentro dos meus braços:

Via Láctea fechando o Infinito!...

 

7:Os ombros Suportam o Mundo - Carlos Drummond de Andrade

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.

Tempo em que não se diz mais: meu amor.

Porque o amor resultou inútil.

E os olhos não choram.

E as mãos tecem apenas o rude trabalho.

E o coração está seco.

 

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.

Ficaste sozinho, a luz apagou-se,

mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.

És todo certeza, já não sabes sofrer.

E nada esperas de teus amigos.

 

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?

Teus ombros suportam o mundo

e ele não pesa mais que a mão de uma criança.

As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios

provam apenas que a vida prossegue

e nem todos se libertaram ainda.

Alguns, achando bárbaro o espetáculo,

prefeririam (os delicados) morrer.

Chegou um tempo em que não adianta morrer.

Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.

A vida apenas, sem mistificação.

 

6:Segue o teu destino- Ricardo Reis

Segue o Teu Destino

Rega as tuas plantas,

Ama as tuas rosas.

O resto é a sombra

De árvores alheias.

 

A realidade

Sempre é mais ou menos

Do que nos queremos.

Só nós somos sempre

Iguais a nós-proprios.

 

Suave é viver só.

Grande e nobre é sempre

Viver simplesmente.

Deixa a dor nas aras

Como ex-voto aos deuses.

 

Vê de longe a vida.

Nunca a interrogues.

Ela nada pode

Dizer-te. A resposta

Está além dos deuses.

 

Mas serenamente

Imita o Olimpo

No teu coração.

Os deuses são deuses

Porque não se pensam.

 

 

5: Desejos vãos- Florbela Espanca

Eu queria ser o Mar de altivo porte

Que ri e canta, a vastidão imensa!

Eu queria ser a Pedra que não pensa,

A pedra do caminho, rude e forte!

 

Eu queria ser o Sol, a luz imensa,

O bem do que é humilde e não tem sorte!

Eu queria ser a árvore tosca e densa

Que ri do mundo vão e até a morte!

 

Mas o Mar também chora de tristeza ...

As árvores também, como quem reza,

Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!

 

E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,

Tem lágrimas de sangue na agonia!

E as Pedras ... essas ... pisa-as toda a gente! ...

 

 

 

4: Howl- Allen Ginsberg

 

I saw the best minds of my generation destroyed by madness, starving hysterical naked,

dragging themselves through the negro streets at dawn looking for an angry fix,

angelheaded hipsters burning for the ancient heavenly connection to the starry dynamo in the machinery of night,

who poverty and tatters and hollow-eyed and high sat up smoking in the supernatural darkness of cold-water flats floating across the tops of cities contemplating jazz,

 (…)

 

3:Cornered- Charles Bukowski

 

well, they said it would come to

this: old. talent gone. fumbling for

the word

 

hearing the dark

footsteps, I turn

look behind me…

 

not yet, old dog…

soon enough

 

now

they sit talking about

me: “yes, it’s happened, he’s

finished… it’s

sad…”

 

“he never had a great deal, did

he?”

 

“well, no, but now…”

 

now

they are celebrating my demise

in taverns I no longer

frequent.

 

now

I drink alone

at this malfunctioning

machine

 

as the shadows assume

shapes

I fight the slow

retreat

 

now

my once-promise

dwindling

dwindling

 

now

lighting more cigarettes

pouring new

drinks

 

it has been a beautiful

fight

 

still

is

 

2: Adeus- Eugénio de Andrade

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,

e o que nos ficou não chega

para afastar o frio de quatro paredes.

Gastámos tudo menos o silêncio.

Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,

gastámos as mãos à força de as apertarmos,

gastámos o relógio e as pedras das esquinas

em esperas inúteis.

 

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.

Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;

era como se todas as coisas fossem minhas:

quanto mais te dava mais tinha para te dar.

 

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.

E eu acreditava.

Acreditava,

porque ao teu lado

todas as coisas eram possíveis.

 

Mas isso era no tempo dos segredos,

era no tempo em que o teu corpo era um aquário,

era no tempo em que os meus olhos

eram realmente peixes verdes.

Hoje são apenas os meus olhos.

É pouco, mas é verdade,

uns olhos como todos os outros.

 

Já gastámos as palavras.

Quando agora digo: meu amor,

já se não passa absolutamente nada.

E no entanto, antes das palavras gastas,

tenho a certeza

que todas as coisas estremeciam

só de murmurar o teu nome

no silêncio do meu coração.

 

Não temos já nada para dar.

Dentro de ti

não há nada que me peça água.

O passado é inútil como um trapo.

E já te disse: as palavras estão gastas.

 

Adeus.

 

1:Bluebird- Charles Bukowski

there's a bluebird in my heart that

wants to get out

but I'm too tough for him,

I say, stay in there, I'm not going

to let anybody see

you.

there's a bluebird in my heart that

wants to get out

but I pour whiskey on him and inhale

cigarette smoke

and the whores and the bartenders

and the grocery clerks

never know that

he's

in there.

 

there's a bluebird in my heart that

wants to get out

but I'm too tough for him,

I say,

stay down, do you want to mess

me up?

you want to screw up the

works?

you want to blow my book sales in

Europe?

there's a bluebird in my heart that

wants to get out

but I'm too clever, I only let him out

at night sometimes

when everybody's asleep.

I say, I know that you're there,

so don't be

sad.

then I put him back,

but he's singing a little

in there, I haven't quite let him

die

and we sleep together like

that

with our

secret pact

and it's nice enough to

make a man

weep, but I don't

weep, do

you?